Ateu ou agnóstico? Tão mais interessante discutir o próximo capítulo da novela das nove. E nem eu sei mais ticar a resposta correta. Agora, calma lá! A proximidade do Natal tem um efeito imediato e faz eu praticamente virar uma soprano carola com terço na mão e água benta debaixo do braço. Dezembro nem começou direito e eu já programei o modo repeat para All I want for Christmas Is You da universal Queen dos agudos: Mariah Carey. No ano passado, montei até árvore bonita que foi estraçalhada pelo meu saudoso Joaquim. Por enquanto, o pisca-pisca está guardado. Com dois filhotes felinos, ainda não encontrei a forma mais segura de iluminar a casa ou escolher um tipo resistente de Papai Noel.
E essa afeição natalina ainda é tão bem preservada, principalmente, pelo o que essa data já representou nos corredores da infância. Hoje, o ser humano anda mudado: ganhou uns fios a mais, uma necessidade de abreviação, a edição frenética da vida e um olhar adicto sobre uma tela multifuncional e essencialmente vazia. Não se tem mais, não como antes: é uma espécie de usuário de si. E tal tendência gerou consequências avassaladoras na celebração dos rituais. Dos encontros. Dos antigos moldes que, uma vez, caracterizaram reuniões familiares. A reunião pela reunião, o contato histérico de uma família de origem italiana e de coração gigante.
Além, é claro, da triste perda de todos os entes alcoólatras, responsáveis pelo excesso de alegria e entusiasmo que facilmente ativo na minha memória quando chega essa época do ano. O tempo é implacável e na mesma medida: despedidas e novas uniões alteraram uma conjuntura antes tão saborosa e singular. Sem contar que o meu superego sagitariano já começa a traçar o desenho de uma retrospectiva cuidadosa sobre um 2024 bastante complexo — para dizer o mínimo.
Muitas dívidas e decepções no bolso, suportar o engasgo angustiante em lidar, pela primeira vez, com a solidão, pensamentos intrusivos sobre a morte e as rugas, questionamentos incessantes sobre a direção do vento, o equilíbrio dos cosmos e o tamanho das sombras. Aprender a abraçar, de maneira sadia, a possibilidade da casualidade, o sexo pelo sexo, sem grandes densidades ou promessas incabíveis e celebrar genuinamente quando um encontro sai do plano virtual e se materializa numa mesa reservada no canto de um restaurante gourmet, mesmo sabendo que o avestruz vai desaparecer na sequência e nunca mais mandar um sinal de fumaça.
No Brasilzão de mon dieu, aquele-que-não-deve-ser-nomeado conquistou mais um ano de soltura, mas com um número maior de provas para a tão aguardada prisão. A Polícia ganhou novos tentáculos e agora já joga as pessoas da ponte, sem hesitações. Descobri que a única livraria de Altamira, no Pará, foi fechada. O principal motivo: o dono era de esquerda. Já o comando das prefeituras? Essas não. Seguem pela direita, dando voltas no próprio extremismo, em busca do longo rabo fascista. Os maiores entusiastas da espécie já se explodem em Brasília, o Centrão nunca teve tanta fome de dim dim e o Congresso quer fazer o estuprador mais respeitado do que o estuprado.
Mas aterrisso, enfim, no clímax desse blá blá blá compulsivo. 2024 foi também um ano em que levei a escrita como nunca e preciso agradecer a cada um de vocês. Aos que estão aqui há muito tempo e aos que acabaram de chegar. Aos que chegarão ainda, o meu: MUITO OBRIGADO! Cada texto que se abre é uma aventura escolhida. Faço com o maior empenho e com a intenção de me superar. Fiz dessa newsletter, um verdadeiro espaço de experimentação e investigação literária e nunca me arrependi por qualquer linha escrita. Por aqui, eu me revejo, eu estudo, eu me comprometo e vislumbro um lugar. Exclusivo. Autoral. Reconhecido. Um espaço de produção, onde eu fui honesto comigo e em cada parágrafo, de cada texto, me fiz presente, me fiz entregue e isso é de enorme valia. Exprime um significado, estabelece uma rota para a imprecisão que comanda a vida. Eu só posso agradecer.
Ao ano que vem, já fiz uma lista com ponderações e poucos objetivos. Não os revelarei, preservo os meus segredos. Nos fones, Cigarettes After Sex e Joni Mitchell. Estranho a combinação também, ainda mais por serem nomes gringos. E que vontade, viu? Largar tudo e passar um tempo fora. Vazar sem grandes informes ou festa de despedida. Só por algum tempo ou por mais tempo ainda. Não sei. Uma cidade pequena, distante e fria. Escrever o meu tão sonhado romance ou mais um livro de poesia. Estou farto de batalhar por mais tempo. Não compro mais a ideia. Nem sei dizer se algum dia acreditei. Para onde foi? Só imagine? Desistiu de tudo e foi desenhar montanhas. Ninguém sabe onde e o nome no R.G. quebrou ao meio. Responde apenas por uma sílaba e diz já estar bom demais. Ameaça quem toca a campainha com grunhidos e vocais assombrosos. Esticou o cabelo e pintou inteiro de roxo. Nunca explicará o motivo. E eu visualizo toda a cena. Um longa, quem sabe? Uma história convincente que me fará tema de documentário, o protagonista de um musical ou de uma nova animação da Disney. Bem melhor do que Moana. Mais convincente do que o Papai Noel.
🎅Feliz Natal, andantes!
Lucas Galati
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Linda reflexão..como sempre!!
Feliz Natal!!
nos últimos anos, tenho tentado (e conseguido com relativo sucesso) evitar que dezembro vire uma maratona de eventos e compras. deixar que o tal espírito natalino (que nem tenho muito) seja guiado mais pela presença do que pelos presentes. feliz natal! 🎅