VOILÀ!
Sei que hoje não é dia de publicar uma nova edição da newsletter, mas a construção desse espaço nunca foi pensada para seguir uma estrutura rígida na seleção de conteúdo e nem respeitar cálculos de frequência e timetables conservadores que pudessem me castrar de alguma forma. Sendo assim, VOILÀ! Uma rápida surpresa para vocês nesse final de domingo. Espero que esse embrulho virtual permita que esse dia tão complexo se desenrole numa linha perfeita com começo, meio e fim ou que esse texto sirva, pelo menos, como uma forma de reflexão.
Costumo ter vontade de me recolher no domingo e sintonizar o silêncio como estação favorita ou para evitar os dentes afiados da angústia, que amanhecem perto da minha jugular, loto a agenda com passeios, exposições, parques, restaurantes até a badalada das seis da tarde, quando tenho que retornar para casa e forçar uma soneca, uma vez que a semana daqueles que trabalham de madrugada começa já no domingo à noite.
Mesmo com o clima escaldante que assola São Paulo, decidi arriscar passos corajosos pela Avenida Paulista. Não encaro bem o calor, rapidamente me torno monotemático e apesar de não resolver, reclamar é a única forma de aliviar o coração em chamas. Depois de expelir palavras ácidas, sigo num cortejo peçonhento até um shopping ou o cinema mais próximo. Hoje, os dois foram bem-vindos, afinal na terra da garoa até o ventinho do final da tarde deu goodbye e partiu para o outro lado do globo.
Mas é do cinema, mais especificamente da discussão proposta no filme “Todos Nós Desconhecidos” que quero hablar. Se eu gostei do filme, não muito. O final dá uma estragada num enredo que vinha bem. Terminei triste de me ver numa versão espírita do Crepúsculo. Quem gosta de um suspense bem gay, cinco estrelas na certa. Paul Mescal é realmente de tirar o fôlego e a cara de psicopata do Andrew Scott me encanta. Um trailer pra dar um gostinho…
Não será perda de tempo, I promise. Principal motivo? A dificuldade de determinar o tempo e o espaço ao longo da narrativa e um diálogo extremamente compatível às aflições que dominam o universo LGBTQIA+.
Aos héteros que quiserem contestar, estou sem paciência.
Quem lembra daquele momento precioso, onde você é praticamente obrigado a se reintroduzir na sua própria família e revelar com quem você se deita? Uma delícia! Uma exposição bem tranquila, nada invasiva e que vem acompanhada de frases otimistas, como: Eu não quero que você sofra, Toma cuidado na rua! Só fico triste de não ter netos e por aí vai. Os tempos mudaram, mas os discursos nem tanto. Eu poderia seguir estrada afora despejando doses de afirmações e constatações que fazem a culpa desse futuro ou já convicto homossexual virar uma amiga mala e vitalícia e o medo não é uma opção é o cimento da estrada.
No entanto, o filme trabalha de maneira magnífica com uma ideia que há muito convivo no meu grupo de amigos e vejo ser um assunto realmente caro ao público LGBTQIA+: o medo da solidão. Minha juventude foi dentro das baladas gays que funcionavam como verdadeiros guetos, onde apenas ali dentro poderíamos existir em liberdade. As boates serviam como uma sala de aula. Elas me ensinaram e me reergueram nos piores momentos. Em épocas amargas, de uma tristeza profunda, eu encontrei um espaço para me reconhecer. Eu pude me aceitar. Ter forças e tempo para dizer quem eu realmente era, como eu gostaria de ser tratado, descobrir o amor nas suas mais instigantes formas; dar um reset, começar de novo, num excesso de honestidade que eu nunca mais deixei se perder.
Mas acho que a minha geração, mesmo tendo caminhos bem mais abertos graças à luta de tantos e tantas, ainda voltava pra casa desacompanhada. Teve que abrir mão de amores imensos pelo medo de assumir de frente o que realmente acontecia; muitos evitaram falar, muitos foram agredidos ou expulsos de casa. Há também aqueles que, depois de tantos encontros por aplicativos, decidiram se anular para dar voz apenas ao outro que aceitou mais duas semanas de encontro ou um pedido de namoro. Além da nossa querida sociedade que nos rotula como promíscuos a todo instante. Que não consegue tratar com respeito e dignidade a nossa forma de amar. “Todos Nós Desconhecidos” trabalha a solidão de um ponto de vista tão crível e próximo da realidade que o longa já vale por isso. Uma solidão que nos foi obrigada, imposta goela abaixo, que não foi escolhida.
E é claro que o mundo segue o seu curso, que a luta continua, que nada está fixo e que esse medo enfraquece quando a sociedade avança. E se o medo não precisar mais ser uma defesa, a gente se encontra com mais facilidade, entende melhor os nossos gostos e reflexos, a nossa forma de amar. Seja ela qual for.
A gente conhece o nosso desconhecido.
Lucas Galati
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Desde já, meu muito obrigado e bom domingo!
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Muito sensível seu texto, Lucas. Ainda acredito que as próximas gerações virão mais conscientes, inclusivas e com menos preconceitos.
E realmente, esse calor é insalubre. Se eu consigo fazer 1 única coisa já me dou por satisfeita.
eu fico muito monotemático no calor também. ô troço insuportável! hahaha