Risco de extinção
Estou exausto.
E contente em poder assumir a constatação de frente para o espelho, enquanto delimito a diferença entre as minhas olheiras. Parece tão simples, né? Chegar a uma conclusão brutalmente contemporânea como essa…mas não.
Não justamente por eu estar numa idade, 35 anos, em que os ouvidos ainda recebem argumentos enfadonhos sobre a minha suposta flor da idade ou que eu tenho ainda muito para queimar. Indubitavelmente, tais análises simplistas são quase sempre proferidas por um jornalista 50+ com algum histórico dentro das redações e ansioso para o dia da sua aposentadoria, quando poderá, enfim, preparar um Power Point mental dos anos em que esteve incumbido de alguma editoria ou de um produto com possível sucesso.
E é claro que eu poderia bater no peito e dizer que entra por um lado e sai pelo outro, mas, talvez, eu realmente queira saber onde está a minha pseudo-flor da idade e se essa espécie ainda permanece viva dentro do meu organismo florestal. As condições adversas dificultam a preservação. Em primeiro lugar, são mais de 8 anos trabalhando de madrugada. Um horário que, com ajuda de muita melatonina ou algumas bolinhas mais poderosas, se torna mentalmente possível, mas destrói o seu corpo dia após dia. Principais sintomas: intestino assustadoramente frágil, zumbido e dores infernais na região dos ombros e da cervical. Isso tudo, por enquanto…
No meu caso, eu ainda tenho uma sorte. Não trabalho no final de semana, justamente pela inversão dos horários. Importante lembrar! Caso exista algum estudante que queira se aventurar na arena do jornalismo: apague sábados e domingos como dias de descanso. Não me contaram isso a long time ago. Agora, imagine o seu astral na madrugada de segunda-feira. Numa rápida analogia, é quase como enfiar aos poucos grãos de areia nos olhos, alimentar dúvidas reais se você está acordado e se prevenir com banhos rápidos na pia do banheiro para que o corpo desperte do desejo do sono profundo.
A exaustão bebe também daí. O copo, porém, é fundo. E por mais que trabalhar de madrugada seja um fator bastante responsável pelo estado que me encontro está longe de ser o único. Inverter o horário de trabalho é inverter uma rotina inteira. É tentar encaixar pessoas e serviços na sua escala vampiresca. Quase sempre é impossível e você desiste. Desiste da academia, já que pela manhã, você volta do trabalho exausto e não tem vontade de sair mais de casa. No período da tarde, quando você acorda, a academia já lotou e revezar aparelho é pior do que assistir ao programa do Danilo Gentili. Horário para namorar, sair para jantar ou brejas com os amigos fica apenas no plano das ideias. Se acostume ao som das marretadas das obras do seu bairro, serão empolgantes canções de ninar. Se precisar fazer a dieta de uma nutricionista, a organização terá que ser militar para dar certo: café tem que virar janta, janta vira almoço, almoço é o café. Fácil, não?
Eu poderia me estender, mas acho que o panorama foi desenhado com sucesso. E existe, além disso, um elemento que vem antes de tudo o que foi aqui descrito. Assumir estar exausto. Por muito tempo, acreditei na lógica perversa da produção a qualquer custo, de não poder errar e de que o esforço se pagaria. Não funciona assim, infelizmente. O corpo cobra e as prestações são caras. Muitas vezes, vitalícias. E o entendimento veio aos 35 anos que, para mim, soaram como um meio de percurso. Uma vontade de reavaliação recheada de medos, angústias e frustrações. Ao mesmo tempo, a chance de sedimentar crescimentos necessários e encarar de frente a finitude.
Eu posso estar exausto. Eu me permito respeitar esse estado. Ao mesmo tempo, tenho desejado mais praias ou montanhas em viagens ou fugas. Tenho pensado em fazer loucuras, acreditar ser viável e que ainda dá tempo. Tenho idealizado um mestrado ou um intercâmbio, uma cama maior, a minha sonhada prateleira para expor os meus livros. Tenho pensado na Lua e em Minas Gerais. Tenho sentido muito medo e instantes de uma liberdade absoluta. Tenho me respondido aos poucos e me perguntado como nunca.
Lucas Galati
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"As coisas foram bem feitinhas neste mundo, a gente que tem a mania de quebrar os brinquedos."
"Sonhando com tudo o que a agenda tem enorme preguiça de lembrar."
Frases de Cássio Zanatta que ecoam no seu texto.
Gostei muito da sua reflexão-desabafo!
"Tenho pensado na Lua e em Minas Gerais. Tenho sentido muito medo e instantes de uma liberdade absoluta." Que bonito isto!