A caçada por ovos de Páscoa terminou com apenas um Ouro Branco dentro da bolsa. Encarei como uma piada, afinal é realmente de ouro que, hoje, o feriado se trata. Só não branco, dourado e brilhante. E os fios de azeite viraram gotículas, uma borrifada em cima de notas de cem com gosto de bacalhau. Humm! Mangia che te fa bene!
E na calada da noite, enquanto eu admirava a Lua, reparei no formato circular do astro que me remeteu aos bombons brancos escondidos dentro do meu ovo de chocolate estrategicamente guardado. Retirei com cuidado a proteção de alumínio, evitando chamar a atenção de possíveis ouvintes noturnos e fui surpreendido pelo vazio. Um ovo oco. Repleto de silêncio. Restou uma mordida tímida em uma das cascas e deixei o mesmo silêncio reger todo o espaço; todo o dia que também marcou os 60 anos do golpe militar no Brasil.
Com esses dois silêncios — um dominando o estômago e o outro, a cabeça — abri hoje esta página virtual. Uma queda certeira bem no dia da mentira. Uma queda doída e não com uma, mas duas verdades azedas para digerir. Em relação ao silêncio do meu ovo de Páscoa, cuidarei depois. Fico agora com o silêncio que dominou as ruas do país e os corredores do Planalto nesta data, no mínimo, importante.
A saída de Jango do poder acontece em primeiro de abril de 1964, mas há quem diga que o golpe já se colocava em prática um dia antes. Além disso, militar nenhum gostaria de anunciar um estado de exceção num dia da mentira. Um golpe duro que nocauteou a democracia por mais de 20 anos e alterou os rumos do país. Um golpe que ainda produz efeitos arrasadores e estremece bases tão caras para quem enxerga a liberdade como a única opção. Por isso, não há explicação cabível para o contraditório posicionamento dado pelo governo atual para que os ministérios não fizessem atos dos 60 anos do período mais terrível da história contemporânea brasileira. Apenas 8 dos 38 ministros fizeram referências ao tema em redes sociais. O presidente Lula justificou a postura como um mecanismo de renovação e de que a preocupação deve estar voltada a tentativa de golpe no dia 8 de janeiro do ano passado.
A fala de Lula esbarra, no entanto, numa reflexão anterior. É possível ter futuro sem reconhecer o passado? E sobre os 20 anos que durou o regime militar no país, há muito mais esquecimentos do que investigações e culpados. A agência Pública divulgou uma reportagem, depois de mergulhar nos arquivos do Serviço Nacional de Informações, o principal órgão de espionagem daquela época. A publicação evidencia a importância deste mecanismo repressor e como ele foi responsável pelo fichamento de cerca de 300 mil brasileiros. Muitos deles, presos, torturados ou até assassinados.
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