Menos Disney, mais Diz-me
Bom, mais uma vez, eu estou aqui.
Em frente ao computador com um rascunho mental de como tentar fazer desse espaço virtual relevante, um caderno ao lado com os destaques da semana e dois livros que terminei há pouco. Um deles, certamente, será ainda tema ou ao menos inspiração para muitas publicações futuras.
Hoje é uma sexta-feira, dia em que eu normalmente estou ávido por uma mesa de bar com baldes gelados de cerveja e algum amigo ao lado com a mesma intenção alcoólica e predisposição para reclamar das agruras e revoltas que escandalizaram os dias de labuta. Mas esfriou e eu tenho uma verdadeira adoração pelas baixas temperaturas. Estranhamente, acho que o meu corpo inteiro funciona melhor nas estações mais geladas. E, por isso, preferi o desafio das linhas do que o das calçadas.
As últimas semanas não foram tranquilas. Estou correndo contra o tempo para entregar o rascunho de um novo livro para um concurso, mas cidadãos com uma vida ativa na madrugada precisam de uma escavadeira para abrir espaço na agenda que se limita basicamente a duas funções interessantíssimas: trabalhar e dormir. Essa última tem sido radicalmente prejudicada pela pré-adolescência de Pequi e Palmito, meus dois gatos gêmeos que cultivam nesse momento uma energia sobrenatural e não respeitam ainda qualquer instrução ou ordem.
E no meio deste repertório escalafobético, a minha pia do banheiro começou a vazar, assim como o meu humor que escorreu pela casa ao ser brutalmente atingido pela constatação, negada repetidas vezes, da minha dependência emocional do meu namorado que decidiu abruptamente celebrar os 30 anos numa viagem solitária ao Uruguai. Logo que recebi a notícia, comecei a lustrar novamente as minhas galhadas e aumentar a vitrola com Nina Simone, Ella e Amy Winehouse.
E é claro que eu que me julgo desconstruído e antenado, passei semanas choramingando pelos cantos e jogando pedras de gelo na fuça dele. Retomei os meus traumas mais saborosos, tive crises de ansiedade com gotas alucinógenas de insegurança e então, ainda sem aceitar, tomei a decisão de me olhar com rigorosa atenção. Longe de certos ou errados que, ao final, não suavizam as discordâncias moradoras de um apartamento de 50 metros quadrados, percorri o motivo da minha chateação e a minha ilusão originada pelo modo Disney de se relacionar.
Eu achei que eu era a criança Disney. Mas…eu ainda sou. Mais triste do que isso, um adulto Disney. Um adulto-gay-Disney. Socorro! Quero deixar claro que não tenho qualquer pretensão de aliviar o lado dele, mas, definitivamente, eu vesti as botas, arrumei o chapéu e montei no Mickey. Aos trancos e barrancos, equilibrei, ao longo dos anos, poucos e longos relacionamentos que me ensinaram demais, mas não o suficiente para desistir da montaria. A lógica do homem perfeito, de precisar sempre “estar tudo bem” e controlado na relação, de pacificar a qualquer custo, de calar quando for preciso, de sustentar um sonho do casamento perfeito contrariando a saúde mental e, muitas vezes, a financeira.
Síndrome do Peter Pan ou medo da solidão, whatever. O fato é que um relacionamento precisa do diálogo constante e da lógica 50/50. É uma troca de interesses e não uma quebra de braços. Talvez, isso tudo esteja solidificado aí do outro lado desta tela que arrebenta com os meus dedos, mas por aqui, definitivamente, não estava. Ninguém, sozinho, pode ser responsável por uma relação que parte de pelo menos duas pessoas.
Foi dessa forma que eu suavizei o peso dos meus ombros e dei um start no entendimento de que a individualidade não é ladainha ou papo dos botecos da Santa Cecília, ela é essencial. A individualidade te permite saber dividir de maneira igual a felicidade e as dores de decidir acompanhar a vida de outra pessoa. Não acho que exista um manual, longe disso, porém se faz urgente alterar a obrigação de “estar tudo bem” e considerar a fatídica pergunta: “Eu estou bem?”
Termino esse texto com a janela aberta para sentir o frio de éssepê, uma taça de vinho está ao meu lado, os gatos todos perto de mim e eu estou bem. Como eu tenho certeza que o meu namorado também está nesta aventura inédita pelo exterior.
Boa noite para vocês!
Lucas Galati
😜Só para lembrar que você pode adquirir o meu livro AQUI!
👀E se quiser me acompanhar nas redes virtuais:
saber ser "um" é fundamental para viver a "dois".
Achei muito interessante essa experiência do seu namorado de comemorar o aniversário viajando e sozinho. Mas, certamente, eu tbm ficaria chateada. O bom é que amadurecemos e vamos entendendo melhor as situações e os sentimentos.
Delícia de texto! ✨