ENTRE RAÍZES
Uma cidade tem por natureza a imprevisibilidade. Raízes concretas que resistem e se desafiam numa estrutura surpreendente, longe de um comportamento óbvio ou esperado. A cidade pulsa orgânica num ritmo que abraça o prédio de última geração, os gritos de um morador de rua e o beijo de dois namorados que desfiam sonhos e infinitos em cima de um viaduto. A cidade também se esconde dentro de si. Uma forma de proteger as suas joias. Os tesouros que ainda encantam as esquinas de um centro dizimado, mas resiliente.
A Casa de Francisca é um desses amuletos de São Paulo.
Ela encontrou a sua morada no Palacete Teresa, importante patrimônio histórico da cidade restaurado e que abriu as portas, as janelas e as varandas em 2017 para deixar a música voltar a entrar. Se tornou um reduto da MPB. Um espaço de encontro e troca, mas também de holofote para músicos e artistas tão órfãos de palco.
O Palacete Teresa foi reaceso. A prova de que o passado pode retornar, alterar magicamente o presente e colorir novas paletas de futuro. Uma mistura sincopada de três tempos. Acende-se a luz e as estruturas cantam. Você sente o cheiro da primeira loja de instrumentos de São Paulo. Se prestar ainda mais atenção, a rádio Record volta a ativa sob ruídos áureos.
O atendimento acolhedor e rápido se reveza com um cardápio de comida e drinks excitante e contemporâneo. Recomendo o CRUDO DE CARNE DE SOL e o BLOODY MARY — um dos melhores que eu já tomei. Tudo deve ser servido até instantes antes do show começar. Durante a apresentação, nada pode ser pedido e se o xixi apertar espera-se bom senso para uma saída rápida durante uma música e outra. Os garçons voltam a passar assim que o espetáculo termina.
E ontem, foi exatamente assim. Um espetáculo em garrafais. ESPETÁCULO. Acompanhar de pé e dançar até derreter no show de estreia do novo álbum da cantora amapaense Patrícia Bastos: VOZ DA TABA. O álbum tem direção e arranjos de Dante Ozzetti e participações de Caetano Veloso, Fabiana Cozza, Alzira E e Ná Ozzetti. Todas estavam presentes. O poeta e letrista Joãozinho Gomes, responsável por grande parte das composições, também aplaudiu a cantora de pé.
Este novo álbum fecha a trilogia formada pelos discos Zulusa (2013) e Batom Bacaba (2016), ambos ao lado de Dante Ozzetti.
Patrícia Bastos tem a floresta na voz. Cordas vocais que brincam entre a potência e a leveza. Extremos que, se misturados, podem congelar o tempo ou te obrigar a levantar e expandir as suas raízes numa dança entre passados, presentes e futuros.
Uma dança atemporal. Bem no centro de São Paulo.
Lucas Galati
Endereço - Casa de Francisca / Palacete Teresa:
Rua Quintino Bocaiúva 22 - Sé - 1º andar
São Paulo, SP
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