De volta ao Natal
Se na Páscoa, coelhos botam ovos. No Natal, a passagem de um senhor abarrotado de presentes num trenó polar guiado por renas aladas é um imaginário ainda mais onírico. No entanto, as festas natalinas dão um verdadeiro “laço” na cabeça que altera até as coordenadas racionais do humano mais cético do planeta.
Sou uma pessoa cada dia mais distante da religião e estar envolvido numa cobertura jornalística como a da guerra entre Israel e o Hamas agrava o meu ateísmo exponencialmente e põe em cheque o merecido descanso eterno e até um imaginário de futuro promissor para a raça humana. Afinal, eu tendo a apostar que qualquer divindade de nome maiúsculo olharia para crianças palestinas em estado de choque, logo após um bombardeio israelense, e adotaria um posicionamento irredutível: “Caros humanos, não deu certo. Estamos fechando o planeta Terra”.
Mas o sofrimento humano nunca foi entendido como um elemento passível de paralisar conflitos e a qualquer instante, novos drones vão despejar bombas ou mísseis incendiários irromperão divisões no azul do mesmo céu. Sonhos infantis são exterminados na mesma velocidade em que as grandes potências criam armas de destruição em massa. Agora, feche os olhos e suponha, por um minuto que seja, que cada sonho infantil pudesse ser ouvido, ganhar forma e tamanho e sair desgovernado, subvertendo as escaladas de tensão, as construções de fronteiras, as carnificinas.
E se pudéssemos fazer do Natal uma época para as crianças espreguiçarem as asas e planarem livres despejando uma poeira mágica capaz de reorganizar as truculências de um universo radicalmente perigoso? O feitiço que explode no primeiro berreiro, logo depois do corte umbilical e que com o passar do tempo, se desmancha pelas dobras da pele. Como disse, não me identifico com nenhuma religião, mas sou enfeitiçado na primeira nota de uma canção natalina, nas cores quentes da ceia, nos abraços que despertam e renovam a beleza dos vínculos.
O Natal é, para mim, a mais forte celebração humana. Um único capítulo que, para além de salmos enferrujados ou versículos empoeirados, gera comunhão, ações reais e alimenta a frágil estrutura que acende a memória. Um retalho especial numa longa narrativa de presenças. Olhar para o céu e esperar ansiosamente que uma notícia boa possa quebrar, mais uma vez, um instante em tantas outras partes. A mesma poeira iluminada de sabor infantil. E se não for um senhor de origem polar distribuindo presentes caros que seja preservado pela beleza da criança que finalmente se reconheceu no adulto e conseguiu dizer, inesperadamente, que os ama pelo o que eles são. Na incompletude que os compõem. No poder imaginativo que sempre pode ser aceso de novo.
ps: Esse texto é dedicado a Juju, uma criança linda que fez o meu Natal voltar a ser tão mágico. Obrigado Juju!
“INFÂNCIA É A ÂNSIA DE SER INFINITO”
Lucas Galati
Ilustração: Oliver Jeffers
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uau, emocionada aqui...obrigada
Muito lindo! Emocionada aqui!