curiosité
Uma das sete ondinhas optei por deixar em aberto. Eu poderia mentalizar algum pedido genérico ou ainda subdividir até encontrar uma nova classificação para o pulo anual da saúde, por exemplo. No entanto, fiz de caso pensado. Uma ondinha em aberto. Desejei em segredo apenas que a atitude não anulasse o meu instinto quase infantil em gostar de andar na contramão. Que o novo ano mantivesse minha ânsia, muitas vezes, irritante em encontrar maneiras de duvidar do que está posto, de lançar um combo de perguntas nervosas e cortar as pernas do que é facilmente deglutido como uma grande verdade. Que eu conseguisse renovar o meu crivo duramente conquistado e ter a curiosidade como uma guia espiritual. Talvez, a minha ondinha em aberto seja um pedido pela manutenção de um aspecto que me agradou do ano passado. Talvez.
Quero dizer que os meus pulos não puderam ser exatamente pedidos desesperados por renovação. Nem sei também o quanto eu gosto dessa palavra. 2023 foi um ano complexo que passou longe do maniqueísmo posto num raso bom ou ruim. Afinal, o mar vai e volta numa movimentação que está longe de apagar a marola que acabou de se formar ou a onda que se espalhou num tapete de espuma pela orla da sua preferência. O movimento sempre ensina. E entre picos de alegria e um estado catatônico dominado pelo medo e pela angústia, eu me vi humano. Respeitei e abracei o meu fim. Abri espaços para o choro. Para me esperar. Não quis me impor a felicidade goela abaixo. Desenhei equilíbrio numa linha fina e em dias de chuva, esperei por uma clareira ou por um abismo agudo. As belezas abissais de ser instante. De aprender a admirar os chacoalhares da poesia. A inconstância como uma premissa. Nada está posto, nada está resolvido.
E os sonhos existem, for sure. Os meus reverberam próximos da Casa no Campo de Elis. Quem sabe, um dia. No entanto, eles estão lá. E eu ainda aqui. Não quero mais esperar por escaladas asfixiantes. Sinto que apressei o processo e a licença para dirigir sempre me trouxe mais receio do que satisfação. Hoje, eu ando a pé e ainda toco campainhas só para sair correndo depois. Colho flores bravas nascidas do cimento para enfeitar o meu dia. Olho o trânsito caótico e penso em histórias, em livros, em contos fantásticos.
Reconheço o meu desejo pelas mudanças. Por isso, não deixei de apostar nas minhas seis outras ondinhas logo depois da chegada de 2024 e nas dezenas da Mega-Sena. Risos falidos. Quero um outro mundo. Quero mesmo. E tenho desejo de lutar por isso. Fazer mais do que já faço. Encontrar o espaço para brotarem novas rebeldias. Lutas necessárias que estão há léguas do cotidiano insosso ao bater o cartão e ajoelhar para o regime CLT.
E eu sei que parte da minha revolta será feita por meio das palavras. Acho que a minha ondinha em aberto sempre teve nome. Uma ondinha pelas palavras. Palavras aguadas, doídas, inventadas. Palavras descabidas, clichês, proibidas, enrijecidas, ao meio. Palavras cheias de significado ou vazias. Palavras silenciosas, abestalhadas, dispersas, bestiais, livres. Palavras perdidas, palavras achadas.
Palavras minhas.
Lucas Galati
Ilustração: Camilo Martins (@camilo3martins)
Para completar esse texto marítimo que abriu 2024, deixarei uma lista de músicas que me ajudam a mergulhar há tempos e ainda mais agora:
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Muito bom!!!
Adorei!!!🤩🤩