Cor de mel
Vamos, feche os olhos. Agora sim. Admita, porém. Admita o despreparo e a angústia agitada quando a chave tetra se despediu e que algum resquício palavreado, talvez, numa silhueta ou num formato outro qualquer. Talvez, parabólico e protegido pela armadura reluzente de um aracnídeo que se ergue habilmente equilibrado para dar forma ao ar e aliviar, brincante, o conteúdo assombroso de um ideia maturada.
Há alguma forma de se proteger da queda? Qual a claridade que eu te assusto? Será que você entendeu os meus avessos? Que as linhas da minha teia querem resistir? Eu sou um inventor de histórias. Os enredos são presas fáceis e eu os coleciono num emaranhado caótico, sendas que se distraem entre os novelos e os espinhos. E no que você acredita? Eu me enveneno pelo costume quente das narrativas e na visita proibida, tarde da noite, pela falta do meu cheiro, do gosto do meu silêncio, o avesso do meu beijo, você dizia.
Eu ainda tenho o seu nome para repetir, mas o tempo se banha das curvas, dos arrecifes, das baías que nos descascam. Não quero me renovar. Não agora, mas a solidão também tortura. E o que eu vejo de mim? Até onde eu me afundo? E se eu redobrar os lençóis do meu casulo? Ou quiser escalar remotas montanhas inóspitas? As (in)consciências.
Eu preciso ser antes meu. A minha possessão favorita. É disso que eu me sustento quase agora. Quem sabe você realmente me viu? Certamente, nada muda. Mas quem sabe? E eu quase não disse. Evitei qualquer impacto pela exaustão de esperar aventuras alongadas e terminar com mais um livro trancado na estante. Acho que a eternidade não vai adormecer ao meu lado, mas ainda pode me convencer a colorir muitas mãos. Acho mesmo. Eu tenho ensaiado quebrar a visão em várias partes e que as paixões me continuem até quando eu souber discorrer sobre as pinceladas de Matisse, uma ponte cansada, mas colorida de Tóquio, um livro secreto vindo dos confins do Vaticano, o teu olho cor de mel e cheio de desejo…
Só então esperar dos ecos: os olhos do som e deixarem as palavras não serem apenas paralisias.
Lucas Galati
Obra: Henri Matisse, Jazz (1947)
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não dá para se proteger de todas as quedas, mas dá para aprender a levantar sempre que necessário.