ALTO LÁ!
Acho que já está tarde e eu? Exausto de ser múltiplo.
Deve ser normal, mas o arrependimento se alonga junto com os meus cabelos brancos. Não são muitos ainda, mas se despontam são sempre apoteóticos. Eu os arranco com a mesma raiva que eu aniquilaria as bases rígidas que sustentam os monumentos de adoração ao ato diário e canibal de se arrepender. Porém, contudo, entretanto, a minha coleção não é de selos ou adesivos brilhantes. É desse amargor que não se pega, mas que me obriga a acelerar o tempo. E muitos abrirão a boca para opinar levianamente sobre o meu exagero ou reforçar que eu sou apenas um jovem de 35 anos, mas ALTO LÁ! É um saco sentir o pé no acelerador quase todos os dias. Encontrar um mísero e cambaleante espaço para criar, enquanto o arroz está no fogo. Montar o parágrafo perfeito, mas ter que sair correndo para tomar um banho e bater a porta com arritmia, sem perceber que um dos seus gatos ficou preso no banheiro. É infernal rascunhar um primeiro romance e ter que cumprir com a agenda romântica esperada de um parceiro mentalmente estável.
Por isso, o atraso me assombra. E se o meu bonde já passou, qual também deveria ser a resposta seguinte? Eu sei que a escrita não acontece, por aqui, em busca dos possíveis livros futuros, mas por uma necessidade existencial, biológica, inata de me apropriar dela para finalmente me ver inteiro, assim como fazer das linhas, a minha forma de moldar realidades apetitosas. A ação minuciosa que eu nunca desisti e que ainda me persegue, me demanda melhoras, mais entrega, mais rigor. A literatura aceita melhor o tempo, mas não gosta de esperar. E, desta forma, a disciplina é a minha única saída.
Definitivamente, não me considero um procrastinador. Nunca tive esse perfil, mas eu desejo ter uma obra consistente. E para isso, não dá para ser múltiplo todos os dias ou fazer dos finais de semana, uma ode a cerveja e a roda de samba. É preciso o rigor e a disciplina. Mas mais do que isso, EU preciso da solidão e do silêncio para escrever. Um conselho que eu ouvi da incomparável Fernanda Young e que repito como uma mantra. Até eu realmente conseguir arquitetar esse checkmate. Acho que eu fui muito legal com o mundo até agora. Aceitei demais, sorri demais. Um esforço desumano pelo outro. Que saco! E o pior de tudo: a contrapartida dá vontade de chorar. É a migalha da migalha que nem sabiá encontra. Chegou a hora de vestir o meu pijama e fazer exatamente o que eu quero, o que eu preciso. Eu tenho o direito de encontrar a minha melhor escrita.
(Um corte seco, caros leitores. Mas estou rindo alto por aqui…)
Se eu estiver exagerando na dose de intimidade, não pedirei desculpas. Naturalmente. Por outro lado, aceito uma direct com um toque educado: “Querido, acerta a dose da medicação que você perdeu o juízo.” Ou, talvez, seja exatamente isso que esteja acontecendo. Eu estou perdendo o juízo. Ainda bem. E calma! Tem mais. Sem juízo e bem cansado de ser o Sr. Bacana. Chegou a hora de eu me isolar numa casa emburrada no pico mais alto da montanha mais distante. Metaforicamente, é claro. Afinal, o que temos por enquanto é um apartamento de 50 metros quadrados com apenas um quarto e uma cadeira dura que castiga a minha lombar inconstante.
Lucas Galati
😜Só para lembrar que você pode adquirir o meu livro AQUI!
👀E se quiser me acompanhar nas redes virtuais:
tenho tentado cada vez mais desacelerar, encontrar espaços de calma no meio da rotina. a vida não tem cinto de segurança pra gente viver sempre a duzentos por hora.
Desculpe, mas tive de sorrir por aqui. No auge dos meus quase 44 anos, e cabeleira quase totalmente branca (ninguém sabe o trabalho que dá fazer essas mechas platinadas!), tentando escrever num espaço físico um pouco maior que o seu, família, sem gatos, com filhos sem babá sem apego, digo-lhe que meu sorriso não sai tão fácil. Lendo seu texto ele saiu!