A travessia
Pintura “A Face da Guerra” de Salvador Dalí
—
O corsário cruzou
em fuga
o Oceano
que amamentava
a costa seca
nascida
como um pedido
da amante que chorava
lágrimas de areia.
—
O corsário
colecionava corações quentes
e poucos barris de rum.
No doce
que desnorteava as primeiras marés,
entregava as palavras
em milimétrica exatidão.
Sabia inflar verbos,
adjetivar até estancar feridas antigas,
mergulhava nos redemoinhos das juras
que mentia.
Antes de terminar a noite
que clareava como um dia aceso,
os olhos do corsário
entravam para dentro
e nas próprias entranhas
perdia o sentido de prudência e
desembainhava os cortes
até atingir o centro que palpitava vivo.
—
Guardava a relíquia vermelha
em caixas com iniciais talhadas.
Nunca amou e por isso,
não entendia quem voltava.
Nunca quis se reconhecer nas pessoas vazias.
—
Um corsário que se vestia
de corações roubados
inspirados nas noites
de luas ensopadas de vida.
—
Lucas Galati